quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Bullying e "Kung Foge"


Em 1996 fui transferido de uma escola preparatória - na Travagem - para a secundária - no centro de Ermesinde, nos arredores da cidade do Porto.

Turma nova. Colegas novos. Todos se conheciam menos eu. Senti-me um peixe fora de água. Penso que todos conhecemos esta sensação.

Um dos colegas mais tímidos, foi dos únicos que procurou integrar-me e revelou-se até hoje um dos meus melhores amigos.

Nas primeiras semanas quando saía da escola, sentia que estava por minha conta. O meu novo amigo vivia noutro lado da cidade e íamos por caminhos diferentes.

Depois das escadas da escola ficava literalmente sozinho.O silêncio da caminhada de 4 km só era superado pelo peso dos livros.

Se começou a ter compaixão da minha solidão, espere só até saber quem se tornou a minha companhia.

Depois das escadas da escola, havia dois bancos de jardim a uns 50 metros. Passava lá todos os dias.

Pois todos os dias havia sempre lá alguém que provavelmente aborrecidos com a rebeldia de fumar um cigarro ou de dizer palavras proibidas pelos pais e pelos professores, usaram a imaginação para ofender quem passava todos os dias naquele sítio, àquela hora.

Sempre ignorei as bocas, os nomes e os comentários. Em boa parte porque muitos deles nem lhes conhecia o significado! Até que chegou o dia em que em vez de dois naquele banco, estavam quatro e até um quinto em cima duma motorizada Casal Boss.

Apercebi-me que a minha passagem se tinha tornado um momento esperado do dia, mas que neste dia em particular haveria mais pompa e circunstância.

Sem me deixar intimidar pelos olhares, dirigi-me para o "corredor da morte" sem sequer abrandar o passo. Como o coração é um músculo involuntário, esse não consegui deixar que acelerasse.

As bocas habituais foram substituídas pelo silêncio e quando pensei que tinha passado o cabo das tormentas, veio um "cachaço" que me deslocou os óculos para o chão.


O silêncio manteve-se. Apanhei os óculos.

"Não vais fazer nada?" - perguntou-me um deles, enquanto os outros se riam.

Pus os óculos. Comecei a andar como se nada tivesse acontecido.

Tinha andado uns metros quando comecei a ouvir alguém a correr atrás de mim.

Antes que me apercebesse estava no chão, depois de alguém ter tentado sem sucesso saltar para dentro da mochila que levava nas minhas costas.

A paisagem passou a ser cinco pares de sapatilhas. A pergunta continuou a mesma:

"E agora, não vais fazer nada?"

Estava na hora de aplicar os meus conhecimentos de "Kung Foge".

"Pelo menos deixem-me levantar." - respondi.

Assim que me levantei honrei o Carlos Lopes e a Rosa Mota.

Ainda insatisfeitos, os sujeitos correram atrás de mim. A descida da Rua da Costa estava a meu favor, o fumo do tabaco estava contra eles.

Depois de correr uns duzentos metros, apercebi-me que já tinham desistido, mas foi aí que ouvi o som de uma Casal Boss com dois rufias em cima.

Comecei a correr outra vez.

Quando já estavam perto, vi do outro lado da rua alguém a pôr a chave á porta . Atravessei a rua e antes que o dono entrasse em casa, entrei eu por baixo do braço dele.

Ainda me lembro da cara de espanto do homem. Expliquei o que se estava a passar enquanto recuperava o fôlego. Ofereceu-se para ligar aos meus pais e para me levar a casa, mas assim que vi a motorizada a passar para cima outra vez, agradeci e saí como tinha entrado.

A partir desse dia escolhi outro caminho, que apesar de muito mais longe, tinha a companhia certa.

Há um provérbio africano que ensina: "Se queres ir depressa vai sozinho, se queres ir longe escolhe a tua companhia."

Existem caminhos que muitas vezes temos de trilhar sozinhos e o dos conflitos é um deles.

Aprendi muitas lições com esta experiência e gostaria de partilhá-las consigo:


1. A melhor maneira de resolver conflitos é evitá-los.


2. Se alguém o tentar ofender ignore.


3. Ofender é a escolha do agressor, ficar ofendido é a sua escolha.


4. Não reaja a provocações e saia do conflito pelo seu pé enquanto pode.


5. Fugir de uma agressão física não é sinal de cobardia, é sinal de inteligência.


6. Se tiver de escolher entre uma boa companhia e um atalho, escolha a primeira.



Balões de Desculpas

Entre Novembro de 1999 e Novembro de 2001, servi uma missão eclesiástica e humanitária no sul de Portugal e em Cabo-Verde.
Os primeiros seis meses da missão foram na Amadora, zona da Falagueira.
A área em que morava, era um tanto ou quanto problemática e não eram raras as vezes que via a passar droga ou ouvia um tiro ou outro à noite.
Como missionários, tínhamos regras e horários para cumprir. Entre estes era levantarmo-nos todos os dias às 6h30 e às 22h00 estarmos em casa por questões de segurança.
Numa dessas noites, não conseguíamos dormir porque havia um carro nas traseiras do nosso prédio que tinha umas colunas incrivelmente potentes. Faziam estremecer as janelas, apesar de estarmos no terceiro andar.
Vivíamos quatro missionários no mesmo apartamento, eu e três norte-americanos.
Como ninguém conseguia dormir decidimos esperar que a música parasse.
Decidi ir estender a roupa que tinha acabado de lavar, isto já perto das onze e meia da noite enquanto os meu colegas ficaram na sala.
Enquanto estendia uma das peças de roupa, vi balões de água a caírem perto do carro mas sem dar grande importância voltei para dentro. A música do carro parou de repente.
Quando voltei para estender a próxima peça, estavam todos a olhar para cima. Um deles gritou e disse:
"Sabemos quem és! És o missionário português. Quando te apanharmos vamos te desfazer. Anda cá baixo!"
Decidi não aceitar o convite de descer, e apesar de já não haver barulho, por alguma razão tinha perdido completamente o sono.
Quando entrei em casa - vindo da marquise - reparei que apesar de haver pessoas na sala, a luz estava apagada e as janelas estavam abertas. Tinha encontrado os "três estarolas" que decidiram pregar a partida aos tuners mais problemáticos de um bairro da Amadora.
Naquele momento fiquei muito preocupado e praticamente não dormi. Decidi que no dia seguinte ia telefonar aos escritórios centrais e pedir para me mudar de área.
A verdade é que no dia seguinte já não me lembrava do episódio. Até que se passaram alguns dias e imaginem com quem é que eu dei de caras ao chegar a casa?
Pois é! Estava eu e um dos meus colegas norte-americanos a chegar a casa e lá estava o mesmo carro, e os mesmos apreciadores de música ao ar livre.
Eles eram cinco ao todo e assim que nos viram puseram-se à minha volta.
Um deles aproximou-se tanto que encostou a testa dele à minha e perguntou:
"Olha lá! Não foste tu que n'outro dia me atiraste um balão d'água!"
Sem saber muito bem como, abri a boca e respondi:
"Não foi um, foram dois!"
Ele começou-se a rir, os outros também, até que ele me disse:
"Foste um gajo porreiro, disseste a verdade. Se não o fizesses talvez não saísses daqui vivo."
Pedi-lhes desculpa pela brincadeira. Sem saber bem como, começaram a fazer-nos perguntas e a querer praticar o inglês com o colega americano.
Quando demos conta, tínhamos estado a falar com eles quase uma hora.
Qual é a moral da história?
O erro deve ser reconhecido de forma rápida e sem desculpas.
Quando fazemos isto, mesmo quando a culpa não é inteiramente nossa, abrimos espaço para o diálogo e para a empatia.
Já imaginou o que teria acontecido se eu disse-se: não fui eu, ou, foi ele e os outros?
Quando reconhecemos os nossos erros ou até mesmo simplesmente os possíveis erros aos olhos dos outros, a tensão alivia de tal modo que o diálogo torna-se fluído e sincero.
Quando reconhecemos os erros de forma rápida e sem desculpas, até os nossos maiores inimigos ou adversários acabam por se tornar os nossos maiores admiradores.

São só Crianças!

Cresci em Arouca, uma aldeia a 60 km da cidade do Porto e em 1986 a minha família mudou-se para o Porto.
Na ocasião tinha 6 anos e entrei para a 2ª classe na Escola da Bela em Ermesinde. Apercebi-me quase de imediato que tinha um sotaque esquisito que causava gargalhadas e que vir da aldeia era uma desvantagem por razões que nunca me explicaram.
Um dia no recreio da escola, para delírio da multidão que assistia ao jogo de futebol durante o intervalo, o rapaz da aldeia teve a sua oportunidade de brilhar. Atravessei o campo com a bola nos pés, fintei grandes e pequenos e marquei um golo.
Quando me preparava para começar a festejar, vi que o jogo tinha continuado sem a bola original no campo: a bola agora era eu!
Não me lembro das dores que senti enquanto estava no chão a ser pontapeado, mas nunca me vou esquecer da humilhação e da solidão que senti pela falta de coragem dos colegas e da multidão para me defender.
Quando cheguei a casa, a minha mãe entrou em pânico e ao ver a gravidade de algumas lesões levou-me ao médico.
"Os pontapés na zona das virilhas podiam ter provocado lesões que não lhe permitiriam ter filhos." - disse o médico à minha mãe.
A expressão da minha mãe e o silêncio que se seguiu fez-me perceber que a situação era grave.
No dia seguinte levou-me à escola mas não entrei como de costume. Ficamos no portão à espera do protagonista do 4º ano que me confundiu com a bola.
Quando ele chegou com o pai, a minha mãe de 1.60 m explicou calmamente o que se tinha passado.
"São só crianças" - disse ele.
"O seu filho não sai daqui sem pelo menos um pedido de desculpas." - respondeu a minha mãe.
"São só crianças." - respondeu novamente o pai, já com algumas gargalhadas pelo meio, e a abrir alas para o filho entrar na escola.
A minha mãe voltou a explicar-lhe o que se passou, agora num tom mais alterado e a gesticular, e explicou a gravidade das lesões.
"A sua sorte é ser mulher, porque se não fos...."
A frase nunca chegaria a ser terminada. Vi o braço da minha mãe recuar e avançar numa fracção de segundos antes, e logo a seguir o pai do meu colega estendido no chão desmaiado.
Nesse ano lectivo, e nos dois seguintes nunca mais sofri maus tratos ou intimidação. O meu agressor passou a ser um dos meus defensores.
No entanto, fiquei com uma vergonha secreta escondida até ao dia de hoje: ter provocado que outras pessoas se agredissem por minha causa, e não ter sido eu a procurar primeiro resolver esse conflito.
Imagino, como a minha vida teria sido diferente se a minha mãe e o pai do meu colega nos tivessem ajudado a resolver o nosso próprio conflito.
Se ajudarem os vossos filhos, familiares e amigos a resolverem os seus próprios conflitos em vez de os resolverem por eles, irão dar-lhes muito mais do que dois anos letivos de paz podre. Irão dar-lhes a capacidade de ultrapassar obstáculos e adversidades e aprender lições valiosas para o resto da vida.
Um dos atributos mais valorizados e que se destaca mais em líderes na política, nos negócios, no desporto, na religião, na comunidade e nas vossas famílias é a capacidade de resolver conflitos e gerar consensos. No entanto, quando eles surgem, na maioria das vezes responsabilizamos os outros pela sua resolução ou simplesmente esperamos que o tempo e alguma espécie de "magia" os faça desparecer. Desperdiçamos assim, oportunidades preciosas de adquirir este atributo valiosíssimo.
Não são só crianças, e não são só conflitos.

Cintos de Segurança para Conflitos

Porque põe o cinto de segurança?
Quando viajo de carro, as minhas 3 filhas - todas com menos de 12 anos - colocam o cinto de segurança por razões diferentes.

Uma coloca-o porque tem medo da polícia, outra porque o pai diz para o fazer e a outra coloca-o porque sabe que é importante para a segurança dela.
Se a polícia não estiver de serviço ou o pai não estiver no carro, qual delas irá obedecer à lei? Ou ainda mais importante, qual delas será protegida?
Aquele que compreende a lei é de facto o único que realmente a vive.
A sabedoria oriental afirma que os homens fizeram a lei no momento em que deixaram de a obedecer.
Os conflitos que temos hoje na politica, na religião, na comunidade, nos negócios e na familia surgem do desrespeito pela lei. Quando surgem novos problemas e conflitos, a tendência dos líderes é fazer mais leis para restringir e controlar cada vez mais. Uma forma sofisticada e civilizada de terrorismo.
A grande maioria de nós quando se depara com uma lei, precisa de um dicionário e muita força de vontade para a compreender. Porque razão a lei se tornou tão dificil de compreender? Poderemos realmente obedecer à lei sem a compreender?
Se quisermos ter países, sociedades, empresas,religiões e famílias que não estejam em conflito constante precisamos de simplificar a lei de tal maneira que todos - principalmente as crianças - a possam compreender e assim seja óbvio porque razão a vivemos.
Ainda não compreende a lei? Mesmo assim deve segui-la, e nunca pare de procurar a resposta: porque razão faço isto?
Aí sim quando compreender o porquê, sentirá que de facto é essa compreensão que o faz verdadeiramente livre.
Porque põe o cinto de segurança?

Conflitos em Jejum

Há alguns meses atrás, estava a passar por um problema familiar. Eu e a minha esposa temos 3 filhas pequenas com idades muito próximas: 12, 10 e 7 anos.
Tinha reparado que a minha esposa andava muito irritada, principalmente de manhã.
Birras de roupa, indisposição para banhos, pequeno-almoços demorados, lanches por preparar, mochilas com livros em falta, atrasos consecutivos ...
As coisas pareciam piorar a cada dia e apesar dos meus esforços em intervir para resolver discussões não parecia estar a resultar.
Pertenço a uma confissão religiosa cristã que incentiva as suas congregações a fazer jejum. É uma prática muita antiga de adoração em que alguém se abstém de comer e beber durante um período de tempo com um propósito espiritual em mente.
Durante esse tempo, procura-se sentir empatia pelos pobres e necessitados, contribui-se generosamente com alimentos ou dinheiro, medita-se sobre como ultrapassar um problema e tomam-se decisões importantes para a vida pessoal.
Pensei que este problema fosse meritório de jejum.
Jejuei especificamente para que a minha esposa ficasse mais paciente e não se irrita-se com tanta facilidade.
De Sábado para Domingo, depois de quase 20 horas a jejuar acordei às 5h30 da manhã sem sono.
A fome e a sede lembraram-me que estava a jejuar.
Sem qualquer disposição para dormir, preparei-me para o dia e fui ler para a sala. Olhei novamente para o relógio e eram 6h30 da manhã.
Habitualmente acordamos cedo ao Domingo para ir à igreja.
Decidi colocar uma música de fundo suave para ir acordando as crianças. À medida que foram acordando, ajudei-as a vestir-se e preparei-lhes o pequeno-almoço. Quando a minha esposa acordou as coisas já estavam encaminhadas.
Enquanto as crianças tomavam o pequeno-almoço voltei para a sala. Foi nesse momento que pensei: Serei eu o problema?
Durante semanas a fio, enquanto a minha esposa tratava de tudo eu simplesmente cuidava de mim e ficava como espetador. Por vezes até chegava a criticar a forma como as coisas eram conduzidas.
Nas nossas vidas a crítica deve ser eliminada e substituída pela curiosidade e pela vontade de ajudar.
A crítica repreende constantemente, a curiosidade faz perguntas.
A crítica procura o culpado, a curiosidade procura compreender os outros.
A crítica contrói ressentimento e atitude defensiva, a curiosidade constrói cooperação e confiança.
A crítica concentra-se no problema, a curiosidade concentra-se na pessoa.
A crítica faz com que os outros se sintam inferiores e menos confiantes, a curiosidade leva a soluções e conclusões em conjunto.
Até quando iremos pensar que o problema são os outros? Pensemos primeiro que a solução poderá vir através de nós.

Conhece os seus inimigos?

Hà 17 anos atrás, tinha acabado de chegar de comboio á Estação de São Bento na cidade do Porto . Nessa altura, entre a estacão e a Avenida dos Aliados havia um túnel para peões. Eram 8:30 da noite e estava atrasado para uma aula. Como estava algum trânsito e o semáforo para peões estava vermelho, decidi correr pelo túnel.
Mal desci as escadas, dei de caras com 3 jovens. Puseram-se á minha frente. Um deles agarrou-me pelos colarinhos do casaco e encostou-me ás grades de uma antiga tabacaria. Outro revistou-me os bolsos enquanto o terceiro estava alguns passos atrás a ver se vinha alguém.
Numa fracção de segundos , sem pensar muito , olhei nos olhos do que me estava a agarrar e perguntei-lhe:
"Como é que te chamas?"
Tão surpreendente como a pergunta foi a resposta;
"Chamo-me Pedro." - disse o meu novo amigo inesperado.
Entusiasmado pelo sucesso da diplomacia, não me fiquei por aqui:
"E tu? Como é que te chamas?" - perguntei ao que me revistava os bolsos e que acabava de encontrar a minha carteira num dos bolsos do casaco.
Depois dele ter respondido com um revirar de olhos, decidi perguntar ao terceiro que surpreendentemente também respondeu.
As fracções de segundos entre as perguntas e as respostas pareciam demorar horas.
Quando finalmente o último respondeu, ganhei coragem e disse:
"O meu nome é Jaime. Sou de Ermesinde. Podem abrir a carteira. Tenho 120 escudos que é o dinheiro que preciso para comprar o bilhete de comboio de volta para casa."
O que tinha a carteira na mão abriu-a e confirmou o que lhe tinha dito.
O que me segurava os colarinhos começou a aliviar a força, olhou para mim nos olhos e disse:
"Toma a carteira, e nunca mais passes por aqui a esta hora."
Quantas vezes já estiveste numa situação de desvantagem em que a derrota ou o prejuízo parece ser inevitável ? Quantas vezes desististe porque parece que não vale a pena fazer nada? Quantas vezes desistes de comunicar porque pensas que não vais ser ouvido?
Em todos esses momentos o foco está em ti ou nos outros? Pensas nas tuas necessidades ou nos interesses dos outros?
Demasiadas vezes pensas que não és capaz, que estás em desvantagem clara e que não vale a pena sequer lutar por um sonho porque a força dos outros é maior. Mas porque é que pelo menos não tentas de uma forma genuína fazer tudo ao teu alcance?
Muitas vezes os interesses dos outros só interferem com os teus porque não percebem que afinal são as tuas necessidades.
Instintivamente, e conhecendo as tuas limitações, concentra-te naquilo que podes fazer nesses conflitos. Trata os teus inimigos como pessoas: faz-lhes perguntas, ouve-os e pensa nos seus interesses.
Não podes escolher pelos outros, mas podes mostrar respeito, interessar-te por eles e comunicares de maneira simples e eficaz.
Sabes o nome dos teus inimigos? Já pensaste nos interesses deles?
De uma forma genuína e autêntica trata os teus inimigos como pessoas. Se tiverem algo teu, diz-lhes o que isso significa para ti. Talvez te surpreendas com o resultado.

Não Digas Tudo o Que Pensas, Pensa em Tudo o Que Dizes

Estávamos casados há poucos meses, quando pela primeira vez senti ciúmes como marido.
Foi depois duma cerimónia religiosa em que o sacerdote da congregação, um homem relativamente jovem e uma pessoa extraordinária, abraçou a minha esposa e deu-lhe dois beijinhos enquanto lhe perguntava:
"Como estás minha querida?"
Quando saímos da igreja, decidi não falar no assunto.
Afinal ainda estávamos praticamente na nossa lua-de-mel. Não queria estragar o momento perfeito que estávamos a viver ao mostrar-me inseguro ou demasiado sensível.
Cheguei até a pensar: "Como é que eu posso estar com este tipo de pensamentos em relação a este homem? Sou mesmo um "pecador"!"
Passaram-se algumas semanas e estivemos novamente numa reunião com o mesmo sacerdote. No final, o "ritual" do cumprimento demasiado amistoso repetiu-se. O ciúme voltou mas reprimi-o novamente.
Quando saímos da igreja e entramos no carro, notei que a minha esposa estava com uma expressão triste e um olhar vago.
"O que é tens?" - perguntei-lhe eu.
"Não é nada." - respondeu ela.
"Vá lá, eu sei que não estás bem, diz-me o que se passa."
Ela então contou-me que não se sentia bem da forma como era cumprimentada pelo sacerdote. Antes que terminasse de falar, já eu estava a abrir a porta do carro.
"O que é que vais fazer?" - perguntou-me ela.
"Vou dizer o que já penso há muito tempo."
Entrei pela igreja á procura do homem como se fosse pedir a extrema unção para alguém. Quando o encontrei disse-lhe : "Preciso de falar consigo a sós e tem de ser agora."
Encontramos um lugar mais reservado e disse-lhe:
"Sempre que cumprimentar a minha esposa por favor tenha em conta os sentimentos dela e os meus. "

Apesar de ter sido muito menos áspero do que pensava, achei ter feito o impacto necessário para que o comportamento mudasse sem afectar a nossa amizade.
No final desse dia, estávamos em casa e alguém inesperadamente bateu á porta. Era o sacerdote com quem tínhamos estado de manhã.
Pediu para entrar. Depois de nos sentar-mos os três na sala disse:
"Estive a pensar no que me disse esta manhã e peço desculpa se de alguma forma vos fiz sentir mal pela maneira que vos tenho cumprimentado."

Nesta história, não se trata de quem está certo ou quem está errado, quem é a vitima ou quem é o agressor. Penso que no que toca a possíveis conflitos ou a conflitos existentes, esta é a moral que pode tirar daqui:

1. Não diga tudo o que pensa.
2. Pense em tudo o que diz.
3. Os relacionamentos a serem mantidos são mais importantes que os resultados a serem atingidos.

Tal como escreveu o nosso poeta António Aleixo:

"Para não fazeres ofensas,
E teres dias felizes,
Não digas tudo o que pensas,
Mas pensa em tudo o que dizes."

A nossa amizade ficou mais forte naquele dia. Passou a haver mais amor e alegria num aperto de mão ou num sorriso do que em qualquer abraço costumeiro que não era sentido por todos da mesma forma que era dado.

Como seria diferente a nossa vida, se sempre que temos dúvidas sobre a conduta ou intenções de alguém nos mostrássemos vulneráveis  e lhes revelássemos os nossos pensamentos e sentimentos genuínos? Se pensássemos não só no que dizer mas como o dizer?

Hoje esta história vos deixo, não se esqueçam de António Aleixo.

Digam o que já pensam há muito tempo,  digam-no com amor.

Educar filhos de inimigos

Há alguns anos atrás conheci uma pessoa extraordinária com uma história de vida igual a ela, que me ensinou muito sobre como resolver conflitos.
Irei chamar-lhe Carla.
Quando a Carla era jovem, sofreu abuso e maus tratos dos seus próprios familiares. Os abusos chegaram ao ponto do seu irmão mais velho a engravidar.
Apesar de toda a família a aconselhar a abortar, a Carla decidiu levar a gravidez até ao fim.
Toda a família se revoltou contra ela. A própria mãe disse-lhe que se não abortasse nunca mais lhe perdoaria.
Alguns meses mais tarde perto do final da gravidez, ao entrar na casa de banho, a Carla viu o irmão pendurado por uma corda. Tinha-se suicidado. Depois do choque horrível, coube-lhe ainda dar a noticia á família.
O cenário era devastador. Rancor, ódio, tristeza, ressentimento, culpa e vergonha eram os sentimentos que dominavam na família.
Mas a Carla tinha o seu coração cheio de amor, perdão e esperança.
O irmão tinha deixado uma filha de dois anos que tinha sido abandonada pela mãe e estava ao cuidado da avó.
Assim que a Carla teve o filho, a mãe expulsou-a de casa. Como a sobrinha era ainda pequena e se tinha afeiçoado muito a ela, ela levou-a consigo e educou-a como se fosse sua própria filha.
Mais tarde, a Carla casou-se e procurou dar a melhor educação àqueles que sempre amou como seus filhos até hoje.
Apesar de todo o sofrimento, a Carla vive de uma forma alegre e bem disposta.
Sempre que penso nela imagino: como é que ela conseguiu perdoar os que a maltrataram? Como é que ela teve a coragem de ficar sozinha e defender o que ela sabia estar certo? Onde é que ela foi buscar forças para seguir em frente quando tudo à sua volta lhe dizia para desistir?
Ela sempre acreditou que podia quebrar um ciclo de maus tratos e de violência ao amar genuinamente os outros e fazer o que està certo.
Podemos agir em vez de reagir. Podemos controlar a nossa própria vida e escolhas sem estarmos condicionados pelas escolhas dos outros. Podemos controlar o curso das nossas vidas. O único momento que temos é o agora!
Sejam quais forem os maus-tratos que nos infligirem, somos livres para agir por nós próprios em vez de reagirmos.
Não somos simples objectos que recebem acção, somos pessoas que escolhem e agem por si próprias!
Por muito mal que nos façam, temos sempre a capacidade de escolher perdoar e amar. Na impossibilidade de educar os nossos inimigos, podemos sempre educar os filhos deles por meio do nosso exemplo, serviço e amor genuínos.
Obrigado Carla pelo teu exemplo de vida, e por me ensinares que podemos escolher ser felizes independentemente do que nos digam ou façam.
Obrigado por escolheres ser feliz!

Gasolina com Empatia

Em 2004 trabalhei num posto de abastecimento nos arredores do Porto. Trabalhava fins-de-semana no turno da noite, das 23h00 às 7h00.
Numa dessas noites, apesar de ter câmaras de vigilância, um amigo do alheio aproximou-se do balcão e perguntou-me:
"Você sabe o que é isto?" - enquanto me apontava uma pistola.
Olhei para ele nos olhos, abri lentamente a caixa registadora, retirei a gaveta e coloquei-a em cima do balcão:
"Acabei de o contar há alguns minutos, tem 250 Euros. Posso ajudá-lo em mais alguma coisa?" - respondi-lhe eu.
Não pude deixar de reparar nos olhos esbugalhados de surpresa.
Seguiram-se segundos de silêncio excruciante.
Resolvi arriscar. Com as duas mãos no ar, usei uma delas. Apontei para o canto da loja onde estava a câmara de vigilância.
"Vai mesmo sujar as mãos por 250 Euros?"
O silêncio voltou, mas desta vez ele surpreendentemente recolheu a arma.
Senti uma certa tristeza e tensão no ar e perguntei-lhe:
"Aceita um café? Fica por minha conta."
Ele aceitou o café e começou a falar comigo como se fosse um confidente.
Tinha acabado de roubar uma carrinha. Estava a caminho de um assalto a uma casa de Aveiro que sabia estar vazia.
Já tinha sido preso por conduzir sem ter tirado a carta, pois foi apanhado a fazê-lo mais de seis vezes.
Entretanto chegou um cliente e ele com naturalidade agradeceu o café e foi-se embora enquanto eu colocava de volta a gaveta na caixa registadora.
Quantas vezes nos colocamos sinceramente no lugar dos nossos agressores ou inimigos? Nos nossos relacionamentos estamos mais preocupados em ser simpáticos ou empáticos ?
Colocar-se no lugar dos outros parece ser um atributo natural que surge connosco á nascença e que por alguma razão, em algum momento do percurso das nossas vidas simplesmente perdemos esse dom natural.
Um destes dias assisti a um funeral de uma amiga. No corredor da igreja estava a cunhada da minha amiga com o filho. Um bebé muito pequeno ao colo.
O esforço da mãe para não chorar era visível . O bebé olhava para ela á procura de contacto visual. Era como quem dizia: "Olha para mim, o que se passa contigo?"
Quando o funeral chegou ao fim, o choro contido da mãe começou a ceder. O bebé procurava constantemente o contacto visual da mãe. Chorava com a mãe quando ela chorava. Parava de chorar quando ela parava. Punha a mãozinha na cara da mãe como quem a consolava.

Todos temos a capacidade de nos colocar-mos no lugar do outro. Podemos fazê-lo de uma forma genuína , natural e desinteressada.
O mundo está a precisar desesperadamente de autenticidade. Seguramente a empatia é a forma mais autêntica de resolvermos muitos dos conflitos e desigualdades que vivemos em todos os níveis da sociedade.
A empatia não resolve os problemas dos outros , mas ouvir e colocar-se por uns momentos no lugar do outro pode sem duvida dar-lhes a força e a esperança que precisam para tentar mais uma vez . A si dá-lhe a compreensão e a visão a 360º do problema e elimina o preconceito.
Os problemas e os conflitos dos outros, serão um dia o seu problema e o seu conflito, se não tiver empatia autêntica e genuína nos seus relacionamentos.